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segunda-feira, 17 de maio de 2010

Menos um espírito obsessor no mundo


Continuo minha jornada tentando descobrir se existe alguma coisa além da morte, apesar de já ter um pensamento pré-concebido de que não vou achar nada. Pelo menos essas experiências valem como pesquisa etnográfica.

Desta vez, também indicado por um amigo, fui em um centro que prega os ensinamentos de três grandes líderes espirituais da humanidade: Jesus Cristo, Kardec e Ramatis.

Eles fazem um tratamento que dura 24 semanas, divido em 3 etapas. A primeira etapa é realizada durante todo esse período, com um encontro semanal, no qual o indivíduo passa por um processo de desobsessão, passe magnético e palestra. A partir da décima semana, inicia-se o tratamento anti magia negra, também com um encontro semanal, durante sete semanas.

A cura é a última etapa, também com duração de sete semanas. Quem quiser, depois de todo o tratamento, pode fazer tudo novamente ou iniciar a escola de médiuns. Pessoas com graves problemas emocionais vão para a psicoterapia.

Outros serviços também são oferecidos, como psicografia, irradiação, libertação química, evangelização infantil e prece para os desencarnados.

Toda sexta pode-se conversar com o dirigente da casa, que intermedeia uma conversa com seu "guia espiritual", conhecido em outras religiões como "anjo da guarda". É bem parecido com a consulta que fiz com o caboclo, só que o médium não recebe o espírito, apenas ouve o que ele diz e repassa a informação. Essa consulta é a que me interessa, mas só pode realizá-la depois de ter participado de pelo menos um encontro. Irei na próxima sexta.

As pessoas que, assim como eu, vão pela primeira vez, recebem um cartão onde serão marcadas as freqüências nos encontros e as contribuições mensais. Existe uma contribuição mínima de vinte reais, e aí começou minha resistência. Depois de explicar o funcionamento da casa, a atendente afirma que essa contribuição só é feita por quem pode e deseja fazê-la, mas esse procedimento é realizado de uma forma muito constrangedora. Ela pergunta na frente das outras pessoas se você pode fazer a contribuição e pergunta o melhor dia de pagamento. É quase uma intimidação. Claro que disse que ia contribuir, fixando minha data de pagamento no dia 10, informação esta devidamente anotada no cartão.

É óbvio que dinheiro é necessário para quase tudo nessa vida, mas já ouvi depoimentos de instituições religiosas que fazem essa captação de uma forma menos constrangedora. Meu antigo gerente, conforme já expliquei aqui, queria pagar o centro do Caboclo Pena Branca, mas eles não aceitaram dinheiro, ao invés disso, pediram que ele pintasse a fachada da casa. Outros centros não pedem mensalidades em nenhum momento, os freqüentadores por iniciativa própria procuram a administração e se tornam contribuintes. Além disso, junto com o cartão, recebemos outra ficha que também pede uma participação mínima de três reais, que serão utilizados no auxílio das 200 famílias assistidas pela casa com doações de alimentos e roupas. E não é só isso: no salão onde acontecem os encontros possuem latas para depósito de dinheiro para a campanha do quilo.

Depois do cadastro, subi para o salão que fica no segundo andar. Antes de chegar minha vez de ser atendido, parei para ler o quadro de avisos. Em duas pranchetas ficavam cartas psicografadas pelos médiuns, todas elas com de/para, indicando o "autor" da mensagem e seu destinatário. As pessoas preenchem um papel com o nome de um parente morto e esperam alguns dias para receber o recado do além. Os médiuns contatam os mortos, que supostamente ditam as cartas.

As cartas não traziam nenhuma informação concreta, do tipo: o cartão do banco está na segunda gaveta da direita do guarda roupa e a senha é 2345678; ou você não é meu filho verdadeiro, você foi adotado; ou qualquer outra história de família. Todas as mensagens diziam que os remetentes estavam bem e tentavam confortar o destinatário da mensagem. Nada de sobrenatural, eu poderia ficar o dia inteiro escrevendo essas mensagens. Difícil acreditar.


Agora vem a melhor parte. Depois entrei na fila para fazer a primeira etapa do tratamento, que, conforme já expliquei, ocorre durante 24 semanas. Este encontro também é divido em três partes, sendo a  primeira a desobsessão. Um médium recebe um espírito obsessor que, segundo eles, está atrapalhando minha vida. São espíritos que ainda estão muito apegados ao mundo material, por isso não partiram para a etapa seguinte da evolução (acho que serei um quando morrer). Muitos deles ainda acham que estão vivos, parecendo uma mistura de Ghost com Sexto Sentido. Uma outra médium conversou como tal espírito, chamando-o de irmãozinho. Primeiro perguntou o que ele tinha feito contra mim, que respondeu ter realizado algumas magias. Ela, então, pediu para o espírito me deixar em paz, dizendo que o que estava fazendo era ruim e errado, além de me prejudicar. A conversa foi sempre num tom bem infantil. O médium possuído apenas ficava com os olhos fechados e respondia a algumas perguntas balbuciando frases curtas ou acenando com a cabeça.

Depois, a mulher que realizava a desobsessão fez um triângulo com as mãos na testa do "espírito", mostrando para ele que o lugar que o aguardava era muito melhor que o mundo dos vivos, tentando convencê-lo a partir. Depois fiquei sabendo que "eles" realmente partem depois desse processo. Menos um espírito obsessor no mundo.

Também não identifiquei nada do outro anormal. Dois estudantes de teatro de Quintino poderiam fazer a mesma encenação.

Meu amigo me contou que apenas 1/4 das pessoas do mundo estão vivas. Os outros 3/4 são espíritos que não partiram para o plano seguinte. Ou seja, nunca estamos sozinho, eles ficam nos olhando durante 24 horas por dia e nos vêem fazer tudo: tirar meleca, coçar a bunda, fazer sexo e bater uma, por exemplo. Segundo esses dados, o filme do Chico Xavier não foi assistido só por mais de um milhão de espectadores, e sim, mais de quatro milhões!

Depois da desobsessão, recebi o passe e voltei para o salão para assistir a palestra. O tema da noite era cigarro, álcool e carne. O palestrante não se ateve muito ao cigarro e álcool, já que era claro para todos o quanto são prejudiciais. Ele passou 90% do tempo falando sobre a carne.

O palestrante afirmou que a ciência já comprovou que o homem é naturalmente vegetariano, que só passamos a comer carne depois da era do gelo, quando as plantas morreram por causa do bloqueio da luz do sol pela fumaça expelida pelos vulcões. Para sobreviver, passamos a comer carne e nunca mais paramos. Nossos dentes não foram feitos para cortar a carne, o que explica porque temos que mastigar durante muito tempo. Além disso, nosso estômago também não foi feito para digeri-la, o que explica o "mal estar" que nos acomete depois de comer grandes quantidades.

Ainda, segundo ele, o intestino humano é muito mais comprido do que o dos animais verdadeiramente carnívoros, como os leões. Isso faz com que a carne apodreça dentro de nós antes de ser expelida, e até mesmo, antes mesmo de ser consumida, explicando porque sentimos nojo com cheiro de carne crua.

Grandes animais, como a girafa, o elefante e o hipopótamo, são vegatarianos, provando que as proteínas presentes na carne podem ser substituídas por vegetais sem comprometer nossa saúde, força e tamanho.

Existem controvérsias com relação ao que foi dito. Não sou especialista no assunto, mas muitos médicos falam da importância da carne numa dieta saudável e, é claro, existem correntes que defendem ambos os lados. A conversa dele, verdadeira ou não, não me convenceu a deixar esse saboroso hábito, o churrasco continuará fazendo parte da minha dieta.

No final da palestra, as pessoas que estavam indo pela primeira vez ficaram para que o dirigente da casa, que também foi o palestrante, assinasse nosso cartão, além de perguntar sobre nossa impressão do lugar.

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Na sexta da mesma semana fui fazer minha consulta com meu "guia espiritual", mas esqueci o cartão e não pude ser atendido. Fiquei com muita raiva, por causa de um pedaço de papel o responsável pelo centro não pode me atender. Se eu fosse uma pessoa que estivesse realmente precisando de um conselho, de uma orientação, iria sair de lá sem nada. Muita burocracia para uma instituição que se diz pretender ajudar os outros negar atendimento por causa de um pedaço de papel.

Nem sei se vou voltar lá esta vem. Já vi o suficiente.

Um comentário:

  1. Eu não sinto o tal "mal-estar" após comer carne. Ah, tá! Após comer grandes quantidades... Mas, peraí, se eu comer alface em grandes quantidades também vou ter um senhor mal-estar!

    Os referidos animais vegetarianos são ruminantes. Eu, que me lembre, não sou. Há uma teoria de que a vesícula ou um desses outros órgãos digestivos de menor importância seria um segundo estômago involuído. Mas é só uma teoria.Nojo diante da carne?! Eu, definitivamente, sou um felino!!!

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